quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Construindo uma realidade mais satisfatótia




         Havia alguns meses que um amigo me falava do grande amor da sua vida: seu filho. O entusiasmo dele era nítido, dizendo-me da realização que sentia por ser um pai. Marquei então uma visita à sua casa para conhecer o pequeno. O fato é que, contrariando nossas expectativas, no bendito dia, o pimpolho estava com o humor estragado, pegando-nos de surpresa. Seu choro traduzia uma tristeza e dor que emergia daquele coração ainda inocente, levando-me a observar atentamente o que ocorria.

      Enquanto a criança chorava, percebia seu pai dizendo-lhe que não havia motivos para estar daquele jeito. Oferecia-lhe também brinquedos e comidas com o intuito de trazê-lo de volta à alegria. No entanto, não o vi em nenhum momento aceitar ou confrontar o fato de que seu menino poderia estar triste, com medo ou depressivo. Afinal de contas, ele também era um ser humano – pensava eu. O pequeno, obviamente, não sabia nomear o que acontecia em seu mundo íntimo. Apenas recebia, inconscientemente, a informação dada por seu pai de que seus sentimentos não eram bem-vindos. E isto é um fator importante para arruinar a auto-estima de qualquer ser humano. Algo que, por sinal, tornou-se um fenômeno cultural crônico: a invalidação dos sentimentos.

      Quando a vida interior dessas crianças não é refletida de volta para elas, através de pais ou pessoas compreensíveis, que dão nomes aos seus sentimentos e ouvem-nas com o coração aberto, elas podem se fechar em si mesmas e agir de um modo que parece irracional e impossível de se lidar. O que acontece então? A criança poderá se tornar num adulto que, ao sentir tristeza ou raiva, imediatamente emitirá uma opinião a respeito dela: “isto não é permitido, isto é errado.” Então, sua raiva e tristeza se transformam no seu lado sombra porque, literalmente, ela não pode vir à luz – ela não deve ser vista! O que acontece com os sentimentos, quando são reprimidos deste jeito? Eles não desaparecem. Vão para trás de você para afetá-lo de outros modos; pode, por exemplo, fazer com que você se torne assustado, ansioso, estando sempre tenso e na defensiva.

       É importante refletirmos sobre este tema, visto que existe uma semelhança notável entre a forma como lidamos com as crianças e a forma com que lidamos com nossas emoções. Neste sentido, gosto de lembrar que há uma "criança interior" vivendo dentro de cada um de nós. Como tratamos ela? Agimos como um pai “simplista” que nega o que ela sente, dizendo-lhe, por exemplo, que ela está errada por se sentir triste ou deprimida? Será que ela deveria ser diferente para agradar a imagem de um ser humano feliz, realizado e bem-sucedido que idealizamos? 

           Pergunto-me quanto tempo dedicamos para estender a mão a nós mesmos, a fim de retirar estes sentimentos que vivem abafados na escuridão, por terem sidos invalidados ao longo do tempo. É claro que muito eu já desejei cortar estas partes indesejadas de mim mesmo e seguir em frente. Mas descobri que não é possível criarmos uma realidade mais amorosa a partir do ódio por nós mesmos. Somente utilizando as energias da compreensão e da aceitação, que são os verdadeiros blocos da construção de uma realidade nova e mais satisfatória, conseguiremos acolher nossas vidas com todos os seus altos e baixos. E este é um passo importante para vivê-la bem.

Tiago Bueno Camargo*

Nenhum comentário:

Postar um comentário

:) Compartilhe conosco um pouco sobre você. Expresse suas ideias!

Translate